Consumo de ultraprocessados aumentou 5,5% na última década no país
Pesquisa da USP mostra perfil de consumidores dos produtos
Nos últimos 10 anos, o consumo de alimentos ultraprocessados pelos brasileiros teve aumento médio de 5,5%. É o que aponta estudo sobre o perfil de consumidores feito pelo Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens/USP) e publicado na Revista de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).
O núcleo é responsável pelo Guia Alimentar para a População Brasileira. “O aumento do consumo de alimentos ultraprocessados entre 2008 e 2017, embora não tenha sido muito grande, foi significativo. Esse aumento corrobora outras pesquisas que avaliam compras das famílias brasileiras desde a década de 1980, mostrando que o aumento vem ocorrendo há décadas”, explica Maria Laura Louzada, vice-coordenadora do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da USP (Nupens/USP).
Os alimentos ultraprocessados são formulações industriais prontas para consumo, feitas com inúmeros ingredientes frequentemente obtidos a partir de colheitas de alto rendimento, como açúcares e xaropes, amidos refinados, gorduras, isolados proteicos, além de restos de animais de criação intensiva. A pesquisa avaliou os fatores sociodemográficos associados ao consumo desse tipo de alimento e a evolução temporal do consumo no Brasil entre 2008 e 2018.
Usualmente, esses alimentos contêm pouco ou nenhum alimento inteiro em sua composição, além de serem fartos em açúcar e gorduras e carentes de fibras e micronutrientes. Entre eles, estão refrigerantes, biscoitos de pacote, doces e salgados, macarrão instantâneo, alimentos prontos para aquecer, doces, balas, chocolates e embutidos como presunto, mortadela e outros.
Perfil
O estudo apontou ainda que pessoas do sexo feminino, adolescentes, pessoas brancas, com maior renda e escolaridade e moradores de áreas urbanas e das regiões Sul e Sudeste são as que mais consomem ultraprocessados. Outro dado mostrou que cerca de 20% das calorias consumidas pelos brasileiros vêm de ultraprocessados.
No entanto, nos últimos 10 anos, os maiores aumentos no consumo foram vistos justamente entre aqueles que menos consomem: pessoas negras e indígenas, moradores da área rural e das regiões Norte e Nordeste, assim como grupos populacionais com menores níveis de escolaridade e renda. A explicação para esse crescimento são as mudanças do sistema alimentar globalizado, caracterizadas principalmente pela crescente penetração das empresas desses alimentos no país, segundo Maria Laura.
Ela aponta que os alimentos ultraprocessados sempre foram promovidos e divulgados com mensagens sedutoras que podem levar a crer que são superiores a pratos tradicionais, como arroz e feijão, e farão as pessoas mais felizes. "O aumento do consumo se dá por um conjunção de fatores, como redução dos preços relativos, ampliação de oferta nos mais diversos locais de compras, principalmente pela expansão das redes varejistas, e crescente penetração das indústrias transnacionais em áreas mais remotas do país.”
Riscos
A conclusão do estudo mostrou que o Brasil vive uma tendência de padronização nacional e elevação no consumo de ultraprocessados, com consequente aumento de riscos à saúde da população. "Pesquisas consistentes têm evidenciado a associação entre o alto consumo desses alimentos e o risco de obesidade e de diversas doenças crônicas não transmissíveis como diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares e doenças gastrointestinais", alerta Maria Laura.
A pesquisadora lembra que publicações recentes mostram que esses alimentos estão relacionados a danos ambientais, já que contribuem com grande parte das emissões de gases de efeito estufa e causam desmatamento, degradação do solo e perda massiva de biodiversidade. Segundo ela, para reverter a tendência, basta manter a alimentação tradicional brasileira. “Ainda temos grande parte da nossa alimentação baseada em alimentos in natura ou minimamente processados e suas preparações culinárias."
Isso quer dizer que, mesmo com o crescimento dos alimentos ultraprocessados, o arroz com feijão ainda os supera largamente. “É uma grande janela de oportunidade para revertemos a tendência negativa. Ou seja, não precisamos reinventar a roda, mas, sim, fortalecer e resgatar o que fazemos há muitas gerações: uma alimentação tradicional baseada em alimentos in natura ou minimamente processados. Para isso, as políticas públicas são urgentes.”
Maria Laura, que estuda os efeitos do ultraprocessamento de alimentos nas condições de vida e na saúde das populações, aponta que determinadas ações podem colaborar para diminuir o consumo elevado desse tipo de alimento. “Para lidar com esse cenário, são necessárias ações sistêmicas e interconectadas para que as pessoas tenham acesso a uma alimentação saudável: sobretaxação dos ultraprocessados, combinada com subsídios para alimentos in natura ou minimamente processados, restrição rigorosa da publicidade — especialmente, mas não só, para crianças —, rotulagem frontal de alertas em alimentos, proibição da oferta desses alimentos em locais de interesse público como escolas e hospitais, além de campanhas educativas em massa para pleitear o apoio das pessoas para implementação das ações”, defende.
Metodologia
Para realizar o estudo, os pesquisadores utilizaram dados do consumo alimentar de brasileiros e brasileiras maiores de 10 anos de idade das Pesquisas de Orçamentos Familiares (POF) realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) entre maio de 2008 e maio de 2009 e entre julho de 2017 e julho de 2018.
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