Que cansaço!
'Tenho a impressão, se me é permitido, que boa parte do nosso cansaço vem da nossa ilusão de que o sucesso é um direito.'
O que tem lhe feito cansar? Já reparou o quanto a gente anda com a sensação de desgaste físico e mental? Tudo isso como resultado das demandas e das pressões da rotina. Somos uma multidão, à procura de nós, sem saber onde nos perdemos. O tempo todo presentes, mas de alma ausente. Andando em círculos, sem ter consciência do espaço. O trabalho é casa, a casa é trabalho. Conectados. Sobrecarregados. A todo instante monitorados. Cercados de fios e cabos, à semelhança dos internados em uma UTI. Pelo excesso de estímulo, informação, exigências, somos uma “sociedade do cansaço”.
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Tenho a impressão, se me é permitido, que boa parte do nosso cansaço vem da nossa ilusão de que o sucesso é um direito. No fundo, faz parte do acordo. Estamos iludidos de que toda essa pressão é por “um tempo”; de que haverá um momento em que, bem-sucedidos, poderemos parar. Acontece que a gente nasceu com um “buraco”. Nesse espaço vazio, no estômago e na alma o furo é sem fundo. “Um abismo chama outro abismo” Sl 42, 7. E, como costumo dizer: a vontade é como uma criança: quer tudo o que não alcança e quando alcança não quer mais. E chega uma hora em que buscar ser o máximo o tempo todo, nos leva a surtar...
Somos seres desejantes, e essa é origem de nosso cansaço e angústia. Estejamos convencidos, há sempre um hiato, uma zona de desconforto, uma tensão mais ou menos consciente entre: “o que eu sou” e o que “eu devo ser”. Se o “querer” é essa besta-fera, dentro de nós que nos cansa e avança - e isso é fato consumado – passemos do excesso à falta. O que nos falta? O que te falta?
Das belas vezes em que, nos Evangelhos, se fala que Jesus “olhou com compaixão” os textos dão testemunho de pessoas que foram alcançadas em suas faltas. Em Marcos se diz que Jesus olha com amor para um jovem cansado, tão pobre que sua única riqueza eram os bens, e lhe interroga sobre suas faltas (“só uma coisa te falta” Mc 10,21). Em Mateus, o Cristo vê uma multidão cansada e abatida, sente compaixão, pois estavam como ovelhas que não tem pastor. Ecoa nessa passagem, e nestes tempos que são os nossos, o Salmo 49(48), 15 em que se diz que quem vive apenas em função das próprias ambições é como um gado gordo, uma ovelha apascentada pela morte.
Não se trata de uma crítica ao sucesso, ou de uma demonização do dinheiro. Como lembrava Abujamra: “o dinheiro é uma benção, mas ele deve ser usado para nos aproximar das coisas que vêm de graça”. A questão, é, antes de tudo, de ter lucidez diante das próprias buscas e do que nos falta. Pode ser que por detrás de tanto comprar e fazer existam, aqui e aí, contas a prestar a uma criança, em nós, que ainda não se curou. Se tudo continuar tendo um preço tão alto a pagar, pode ser que nos distraiamos de quanto isso nos custa...
Que adianta, diz Jesus, ganhar o mundo inteiro e vir a perder-se e a arruinar-se si mesmo? (Lc 9, 25). Talvez, então, o cansaço, sem nome, seja apenas o corpo reclamando contemplação, pausa que restaura, conexão com pessoas, instante... Sigamos o conselho do Apóstolo, que tinha suas dicas de coaching: correi, de tal maneira que conquisteis o prêmio. Quanto a nós, buscamos uma corroa incorruptível. Corramos, mas não sem meta. Lutemos, mas não como quem golpeia o ar... (1 Cor 9,24.25b-26).
Assim, preencha de sentido divino seus trabalhos, suas ambições, suas metas. Em todo o sucesso, lembre-se Cristo, olhe para os lados, pois quem olha apenas para si, empobrece o seu viver. Assim, em meio aos bens que passam (e são uma bênção, ou pelo menos ajudam a fazer um cadim de inveja na vizinha), abrace as coisas que não passam...Comece esse “abraço” pelo amor. Afinal: “quem ama não cansa, nem se cansa” (João da Cruz).
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